O QUÊ: RISCOS DA CANÁBIS PARA FINS MEDICINAIS

Saiba mais sobre os riscos e efeitos secundários associados à canábis para fins medicinais.

O perfil de segurança da canábis para fins medicinais é principalmente devido ao THC. Os efeitos secundários a curto prazo da canábis para fins medicinais são geralmente ligeiros a moderados e transitórios. Os efeitos secundários mais frequentes incluem tonturas, boca seca, desorientação, náuseas, euforia, confusão e sonolência.1,2 Os eventos adversos graves são raros. No que diz respeito aos riscos do THC a longo prazo, há menos evidências, mas os estudos disponíveis sugerem um perfil semelhante ao dos riscos a curto prazo. Os riscos a longo prazo incluem:

  • dependência de canábis: o THC pode causar dependência física e psicológica e existe a possibilidade de consumo abusivo; é importante considerar a eventual história de dependência do doente ao prescrever canábis para fins medicinais.3,4
  • perturbações psiquiátricas: a utilização de canábis para fins medicinais pode exacerbar certas condições, como a depressão, obsessão e psicose; os médicos devem evitar a sua utilização em doentes com antecedentes do foro psiquiátrico ou controlar os doentes quanto a sintomas psiquiátricos novos ou agravados durante o tratamento.3,4
  • perturbações cognitivas: a utilização da canábis para fins medicinais pode estar associada a perturbações cognitivas e à alteração do estado mental; os médicos devem reduzir a dose ou interromper a utilização da canábis para fins medicinais, caso se desenvolvam sinais ou sintomas de perturbações cognitivas.1,4,5

Esta lista não inclui todos os possíveis efeitos secundários da canábis para fins medicinais. Também existem riscos potenciais para os pulmões se a canábis for administrada por via inalatória (por ex., bronquite crónica) 1,4,5 e riscos potenciais para a pele se a canábis for aplicada topicamente (por ex., dermatite de contacto).

Qual é o perfil de segurança da canábis para fins medicinais

Pode desenvolver-se alguma tolerância aos principais efeitos secundários da canábis para fins medicinais. Esta situação parece resultar sobretudo de mecanismos farmacodinâmicos, em vez de farmacocinéticos. No entanto, a tolerância não parece desenvolver-se relativamente aos efeitos terapêuticos, como a melhoria do tónus muscular e a analgesia.1,4

A canábis para fins medicinais está contraindicada em doentes com história de reação de hipersensibilidade aos canabinoides, em doentes com menos de 18 anos de idade, doentes com doença cardiovascular grave, mulheres que estejam grávidas ou a amamentar, doentes com antecedentes de doença mental e doentes com doença pulmonar (para utilização por via inalatória).1,4,6

A exposição aos canabinoides pode dar origem a problemas de memória a curto prazo. A utilização frequente de canábis para fins medicinais em doentes com menos de 18 anos de idade pode resultar em problemas cognitivos.1,4,6

Quais são os riscos da canábis para fins medicinais para as crianças

Está provado que os canabinoides atravessam a barreira placentária nas grávidas e a utilização de canábis durante a gravidez pode aumentar o risco de efeitos adversos fetais/neonatais, incluindo restrição de crescimento fetal, baixo peso à nascença, parto prematuro, bebé pequeno em relação à idade gestacional, internamento na UCIN e nado-morto. A administração da canábis para fins medicinais deve ser evitada em grávidas.1,4,6

Em estudos publicados, as crias de ratos fêmea grávidas às quais foi administrado Δ9-THC durante e após a organogénese, manifestaram neurotoxicidade com efeitos adversos no desenvolvimento cerebral, incluindo conectividade neuronal anormal e repercussões nas funções cognitiva e motora.4

Os efeitos relatados em relação à canábis por via inalatória que é transferida para o lactente foram inconsistentes e insuficientes para estabelecer uma relação causal. Devido aos possíveis efeitos adversos da canábis para fins medicinais no lactente, é importante aconselhar as mulheres a não amamentar durante o tratamento com canábis para fins medicinais. A canábis para fins medicinais está contraindicada em grávidas e mulheres que estão a amamentar.1,4,6

Quais são os riscos da canábis para fins medicinais durante a gravidez ou amamentação

Diversos estudos determinaram que os canabinoides podem interagir com as hormonas sexuais nos homens e nas mulheres e que podem provocar a diminuição da quantidade, concentração e motilidade do esperma. Os doentes devem ser informadas sobre os potenciais riscos se estiverem a tentar engravidar.4,7

Os doentes idosos podem ser mais sensíveis aos canabinoides, sobretudo se tiverem problemas renais ou hepáticos. Os doentes idosos correm um maior risco de queda devido ao seu estado patológico subjacente, o que pode ser exacerbado pelos efeitos no SNC de sonolência e tonturas associados à canábis para fins medicinais. Estes doentes devem ser acompanhados de perto e devem ser tomadas precauções para evitar quedas antes de iniciar o tratamento com canábis para fins medicinais. No geral, a seleção da dose para um doente idoso deve ser prudente, começando normalmente com a dose mais baixa, tendo em conta a maior frequência de quedas, a diminuição da função hepática, renal ou cardíaca, o aumento da sensibilidade a efeitos psicoativos e a maior frequência de doença concomitante ou outra terapia medicamentosa.4,6

Os médicos devem considerar uma dose inicial mais baixa em doentes com insuficiência renal ou hepática. Não se recomenda a administração de canábis para fins medicinais a doentes com insuficiência hepática moderada a grave.4,6

Os sintomas associados a uma intoxicação por canábis podem incluir depressão, ansiedade, ataques de pânico, desmaios, coordenação motora afetada, letargia e alterações no ritmo cardíaco. No geral, estes sintomas desaparecem em poucas horas. Estes efeitos adversos são geralmente toleráveis em adultos saudáveis e podem habitualmente ser controlados com medidas conservativas. O tratamento deve ser sintomático.4

O THC pode produzir dependência física e psicológica e existe a possibilidade de consumo abusivo. No entanto, é pouco provável que os doentes que administram canábis para fins medicinais desenvolvam dependência, embora essa possibilidade não possa ser completamente descartada.4,8

A exposição aos canabinoides exógenos pode provocar a diminuição da atividade dos recetores CB1, com alterações consideráveis no lobo temporal, córtex cingulado posterior e núcleo accumbens. Quando há uma interrupção abrupta dos canabinoides exógenos, a atividade dos recetores CB1, começa a recuperar no prazo de 48 horas. Tal pode provocar uma série de sintomas de abstinência, incluindo irritabilidade, problemas do sono, diminuição do apetite, desejos alimentares, inquietação e/ou variadas formas de desconforto físico. Se o doente consumir canábis para fins medicinais frequentemente (todos os dias) e por um longo período (meses ou anos), pode sentir dificuldades em interromper abruptamente o consumo por iniciativa própria. Recomenda-se diminuir lentamente a titulação da dose do doente, uma vez que mitiga a ocorrência de sintomas de abstinência. É importante considerar o eventual historial de dependência do doente ao prescrever canábis para fins medicinais.4,8

Pode ser aplicada a recomendação existente para a descontinuação ou a redução da dose aplicável a opioides para evitar sintomas de abstinência. Recomenda-se assim uma redução de 5-10% da dose diária de THC a cada 1-4 semanas.9

Referências bibliográficas

  1. MacCallum CA, Russo EB. Practical considerations in medical cannabis administration and dosing. Eur J Intern Med. 2018 Mar;49: 12-9.
  2. Barnes M, Barnes J. Cannabis: the evidence for medical use. London: All-Party Parliamentary Group for Drug Policy Reform. May 2016.
  3. Wilkinson ST, Radhakrishnan R, D'Souza DC. Impact of cannabis use on the development of psychotic disorders. Curr Addict Rep. 2014 Jun 1;1(2): 115-28.
  4. Health Canada. Information for Health Care Professionals: Cannabis and the cannabinoids. October 2018. ISBN: 978-0-660-27828-5.
  5. Hall W. A summary of reviews of evidence on the efficacy and safety of medical use of cannabis and cannabinoids. EMCDDA. 2018.
  6. Häuser W, Finn DP, Kalso E, et al. European Pain Federation (EFIC) position paper on appropriate use of cannabis-based medicines and medical cannabis for chronic pain management. Eur J Pain. Oct;22(9): 1547-64.
  7. Jordan T, Ngo B, Jones CA. The use of cannabis and perceptions of its effect on fertility among infertility patients. Hum Reprod Open. 2020 Feb 13;2020(1): hoz041.
  8. Lichtman AH, Martin BR. Cannabinoid tolerance and dependence. Handb Exp Pharmacol. 2005;(168): 691-717.
  9. Sihota A, Smith BK, Ahmed SA, et al. Consensus-based recommendations for titrating cannabinoids and tapering opioids for chronic pain control. Int J Clin Pract. 2021 Aug;75(8): e13871.